As cócegas podem fazer rir, mas também podem irritar muita gente.

"Seja bem-vindo quem vier por bem!" e "se à porta humildemente bate alguém, senta-se à mesa com a gente!"

Recomendação Sonora

Friday 27 June 2008

Balbino 2 - 2 Oxford


Bem, como não entrei na Oxford School of Drama, (ainda fui à segunda fase, mas não passei à terceira) só me restavam duas opções: ir para o segundo ano da Universidade de Lincoln e fazer Drama, ou tentar a audição para a East 15 para o curso de Teatro Contemporâneo.

Consegui ter sucesso na audição e eis que os lugares já estavam preenchidos. Ainda me ofereceram um lugar para Setembro de 2009, mas esperar um ano...? É que se eu fosse logo para Lincoln, como entro logo para o segundo ano, em Setembro de 2009 estava a começar o meu último ano.

Felizmente, tive a confirmação da East 15 há coisa de duas horas, e estou decidido a esperar um anito, para ir para o curso que mais me alicia.

A East 15 é uma escola de Teatro que faz parte da Universidade de Essex. É uma vivenda ENORME cheia de relva, com um café, um Teatro e muitas salas de ensaio (podem ver um pouco na imagem). Fica ao lado de Londres, e é uma das mais reputadas no Reino Unido.

O Curso de Teatro Contemporâneo distingue-se do curso de normal de actores (Acting) pela sua essência, que é virada para formar "actores criativos". Aprende-se a escrever Teatro, interpretar para televisão e trabalha-se lado a lado com todos os membros da produção, ou seja, muita pesquisa, cultura, creatividade e informação. Uma pessoa que se forme neste curso não só é actor, como pode desempenhar qualquer função no ramo do Teatro (encenador, dramaturgo, luminotécnico, sonoplasta, etc...).

É uma pena não ter sido oferecido um lugar em Oxford, porque nesta altura ainda estaria com dúvidas: "Espero um ano e vou para a East 15 ou vou já para Oxford....?". Assim, não me restam alternativas. Lincoln sempre foi o plano C.

Então, até o próximo ano lectivo, fico em Portugal, vou fazer muitos Castings, muito tudo, a ver se trabalho na área para ganhar a outra parte importante da formação do actor: experiência. Quanto a mim, o meu futuro está definido.

Quanto aos meus amigos, leitores, e toda a gente com paixão por uma determinada área, aconselho vivamente que concorram a estudar no estrangeiro. Eu, por experiência própria, encontrei aqui os cursos mais variados na área que eu mais gosto. Há imensas ajudas financeiras e a formação é brutal. Estudem fora e ajudem a enriquecer o nosso país e a vós próprios.

Tuesday 24 June 2008

Parabéns, Raquel!


Quero dar um beijinho muito especial à Raquel pela apresentação de ontem.

Aqueles que perderam, tal como eu, que saibam que a Raquel interpretou o papel de Desdémona, na peça "Othello" de William Shakespeare.

Por tudo o que tens passado, e por nunca teres desistido, os meus humildes Parabéns! És um modelo a seguir!


Sábado estás deitada ao meu lado, no nosso ninho! E esse vai ser apenas o início de umas férias que vão ser muito compridas!


(peço desculpa aos restantes, mas temos todos destas coisas. A rapariga realmente merece, ainda que para muitos isto pode ser o texto mais gay que fiz! =D)


Amo-te?

Monday 23 June 2008

Saturday 21 June 2008

Carta de Demissão


Como podem ver pela data, a carta já está escrita, mas ainda não foi entregue. Escrevo isto aqui, porque acho importante partilhar esta experiência. Vou trabalhar hoje, no bar, quatro horas, e faço as limpezas no bar amanhã por mais 4 horas. Depois entro uma semana de férias. Domingo, dia 29 de Junho, entrgarei a carta em mãos à gerente. Aqueles que se virem com dificuldades em perceber o inglês e caso tenham vergonha, comentem precisamente isso, que prometo apagar o vosso comentário e fazer mais um texto, desta vez, traduzido para a Língua que nos sabe melhor.


Worcester, 29th June 2008

I, Carlos Balbino, employee of the Prezzo PLC Company, come by this means letting you know that I quit my job as a barman in the Immo Restaurant in Worcester. I have been humiliated, denied help when I asked for it, never motivated, and always told off when did a mistake by the Worcester Immo’s assistant manager. And one of my friends who worked in the same restaurant I work committed suicide due to the stress he was having, something I can not deal with.

After talking with the new manager in charge twice, I had a meeting with the assistant manager, supervisor and manager, in which I was given a Recorded Written Warning for insubordination towards the assistant manager.

On Moday the 16th June, I had my first day as a waiter working with the assistant manager only. I was denied help all the time from the assistant manager who was too busy watching internet videos, making phone calls, talking, wandering around the restaurant and sitting in the sofas while I was doing the job. By the end of the night, after serving all the costumers, closing the bar and cleaning the toilets I was told to clean the floor before doing the cutlery. As it nearly was 23:00 and the assistant manager was willing to wait, since he is a very patient person, I refused to follow his orders because I was doing all the tasks on my own and as a barman, I know cutlery is my priority. If other staff people, who were not working, didn’t show up and started doing the floor under his instrutions he would still watch me doing all the job on my own like he did the whole night. And that was my insoburdination.

The previous day, Sunday the 15th I watched him and his brother (supervisor) just talking and using internet for three hours. Not to mention the times they went out to shop for they breakfast and other ways corruption. I did my job in the bar (cleaning the whole bar) and was never helped, once again by the two staff members hierarchily straight above me, who said in the meeting that I left the bar dirty with candle wax.

The manager never protected me and agreed with all their objections and complains which are from shifts she was not present, even if she agrees I’m competent when working on her shifts. I explained her more than once I was denied help and I was doing the work on my own. Still, she agreed with the supervisor and assistant manager in charging me of insubordination.

I am not complaining, I am quitting and giving solid reasons.

As I’ve told the manager before, I first joined the company in November 2007 as a kitchen cheff but quit two months later because of my student timetable. I was offered a place as a barman in March by the previous manager, Roberto Alesi, who likes me and trusted me to do the job. I also had some conflicts with him, because I was doing some of the stuff that the assistant manager was telling me to do, as later I understood that my job was following the manager’s orders and no-one elses. I never applied for the job and never betrayed the company. As the team work in fact doesn’t exist, I quit because once I was working for a company and now I was working for a person, who is not even the owner of the restaurant.

Wednesday 18 June 2008

O Jardim do Paraíso


Ao tropeçar nos corpos mortos, a menina tentava chegar à árvore de fruta. A árvore era não maior que uma árvore, mas era mais bonita do que uma árvore. Escolheu um fruto que parecia ser mais saboroso do que um fruto e colheu. Mordeu a fruta com uma dentada mais que dentada e a fruta estava podre por dentro. Dentro da fruta havia um lagarto que agora esperneava enquanto deitava sangue e lutava para se manter vivo.

A menina tinha sangue nos lábios. O lagarto tinha o sangue nos lábios da menina. O fruto rapidamente transformou-se em cinzas e esvaeceu-se. O lagarto foi a correr, louco, frenético e trepou de novo para a árvore mais bonita do que uma árvore. Chegou ao ramo de onde tinha sido colhida a fruta que parecia mais saborosa do que uma fruta, e foi para o lugar aonde ela tinha sido colhida. Nesse instante, o lagarto lentamente começou a mudar de cor, para uma cor saborosa, mais saborosa do que lagarto, e começou a ganhar formas estranhas, inchadas, recheadas, transformando-se finalmente num fruto.

A menina olhou à sua volta e os corpos mortos do chão tinham-se levantado. Avançavam agora na sua direcção, de todo os lados, de toda a parte. Limparam-lhe o sangue da boca e fizeram-na deitar no chão. Em seguida deitaram-se com ela, lentamente, com muita serenidade. A menina, insegura, mas pelo calor dos corpos acabou por adormecer. O seu corpo ficou frio, os dos outros também. Assim adormeceu.

Agora, a menina acordou com um pontapé na cabeça. Alguém tinha tropeçado nela. Era um menino que andava em direcção à árvore que não era maior que uma árvore, mas era que mais bonita do que uma árvore. A menina quis levantar-se, mas o seu corpo estava frio. Ela insistiu e lutava para se libertar dos outros corpos em cima dela, que também iam sendo pisados pelo menino que passava. Baixinho, a menina ouviu: "Ainda não te levantes, ainda não é tempo. Espera até ele morder a fruta."

Tuesday 17 June 2008

Coisas Que Deus Finge Não Ver

Mandaram-me encostar o meu orgulho, humildade e amor pela vida à parede. Assim o fiz.
Dispararam balas à cabeça, aos pés, às pernas para que eu caísse. Assim o fiz.
Perguntaram-me se eu tinha últimas palavras, e para as dizer. Assim o fiz.
Levantaram o meu corpo, já sem valor e pediram-me para me aguentar em pé. Assim o fiz.
Dispararam mais outros tantos tiros, queimaram-me vivo e pediram para eu abrisse a porta para a minha cabeça. Assim o fiz.
Encontraram os documentos mais sagrados que eu guardo ao longo da minha existência e e fizeram-me dizer tudo o que sabia deles. Assim o fiz.
Em festa e alegria queimaram as minhas memórias e pediram-me para esquecer quem sou. Assim o fiz.

Hoje quiseram matar-me e fizeram de tudo para o conseguir. Como não conseguiram, pediram-me para morrer.

Mas por alguma razão,



eu não o fiz.

Monday 16 June 2008

Saturday 14 June 2008

Uma Vida Em Dois Actos

Este é provavelmente um dos poucos textos que vou escrever sem segundas interpretações, baseado na minha vida tal como ela é.

Acabei de chegar do trabalho. Saí mais cedo, pelas 21:10, do restaurante. A primeira coisa que reparo é ao olhar para o céu e ver a lua em plena luz do dia. As regras sempre foram daquelas coisas que eu nunca percebi. Afinal de contas é possível serem para lá das 21:00, ainda haver Sol e ao mesmo tempo haver lua.

Hoje quero falar-vos de um grande companheiro que tenho lá no restaurante: o Pawel. O Pawel é polaco e trabalha na cozinha há dois meses. Eu trabalhei na cozinha durante dois meses, mas por causa dos estudos demiti-me e três mais tarde voltei a ser admitido, mas como empregado de balcão/mesa. Sou provavelmente a única pessoa naquele sítio que já fez de tudo ali dentro. Não é algo de que me orgulhe muita, mas decerto é um dos motivos pelos quais eu consigo dar-me bem com todos os empregados. Não me dou com os meus superiores, mas isso é outra história. Muito resumidamente, o Pawel veio da Polónia para substituir a Basia, que mudou de restaurante. Nessa altura, trabalhavam três na cozinha: o Hubert, o Pawel e o chefe da cozinha, Emil. O Emil chegou e subiu logo ao posto de chefe, pois veio ao mesmo tempo que o seu amigo Pawel, mas para substituir o namorado da Basia, quem me ensinou tudo o que sei de cozinha profissional, Damien. Sai Damien e Basia, entra Emil e Pawel. Já se conheciam todos da Polónia, cresceram e estudaram juntos e vieram parar a Inglaterra para prosperar financeiramente. O Hubert manteve-se no seu posto, sendo o terceiro elemento.

Neste movimento de rotação de cozinheiros, o Hubert recebeu a generosa proposta de receber mais duas libras por hora noutro restaurante, a fazer precisamente o mesmo e com a promessa de ainda vir a ser mais aumentado. O Hubert não hesitou e saiu do restaurante num Domingo há um mês e na Segunda-feira seguinte estava no restaurante da concorrência. Ninguém culpa o Hubert, porque neste mundo de luta, quem está parado leva um tiro. Ele fez o que todos fariam e agarrou a oportunidade. Veja-se que o meu restaurante só tem um empregado inglês, que é estudante, e todos os outros incluindo gerente e o sub-gerente são estrangeiros. Por isso há uma certa empatia com este tipo de situações, que acontece com muita frequência. O Hubert foi em paz.

Nisto, ficaram os dois amigos - Emil e Pawel - a trabalhar na cozinha. Já moravam juntos, no mesmo quarto - um no sofá, outro na cama - porque é mais barato e trabalhando juntos, mais ligados e dependentes um do outro ficaram. A semana passada vendi a televisão do meu senhorio por 25 libras, porque eles tinham uma Playstation e queriam jogar e não podiam. Como o meu senhorio é uma pessoa que gosta de enganar os inquilinos, perdeu um bem material, ainda que sem saber. O Pawel e o Emil ficaram todos contentes, pois já podiam jogar lá no seu quartinho.

A Mariom - uma empregada de mesa - perguntou-me hoje quase a chorar "porquê?". Eu achei a resposta óbvia. Vê-se mesmo que ninguém sabe como é trabalhar na cozinha. É muito fácil enviar pedidos e mais pedidos e na reunião falar mal da cozinha, que são lentos, apesar de saber que são só dois num restaurante com mais de 70 cadeiras. Ela disse que sabia que o Pawel tinha a mãe doente, mas que nunca chegou a falar nada mais aprofundadamente com ele, porque o inglês dele é praticamente nulo.

Para mim, quase que sem reacção, consigo em fracções de segundo racionalizar a situação e responder aos "porquês" de todos, que muito admirados ficam. O Pawel devia ter começado a trabalhar às 18:00 e estava mais de uma hora atrasado. É Sábado, o dia mais ocupado da semana no restaurante e a presença dele é indispensável. O sub-gerente disse logo que agora tinham comprado uma Playstation e que o Pawel deve ter-se deixado em casa a jogar. Mandaram a senhora que lava a louça, outra Polaca, a Ana, ir lá a casa e chamar o Pawel.


O Pawel enforcou-se.


Ela veio a chorar, o amigo e companheiro dele, Emil, vou a correr para a casa largando tudo o que estava a fazer, com os olhos lacrimados. Choque entre os empregados de restaurante, os poucos clientes que lá estavam nunca chegaram a saber o que realmente se passou. Os clientes seguintes ficaram a saber que estavamos com problemas de ordem técnica na cozinha e que não iamos mais servir refeições hoje. Os que fizeram reserva foram contactados por telefone e ouviram a mesma explicação.

Tivémos de ir fechar a cozinha, limpar tudo. Como já tinha trabalhado lá, pediram-me para orientar lá as limpezas. Ao limpar, voltou a surgir-me a ideia de que as regras não servem para nada, que eu não devia estar ali, que eu não estaria ali se não fosse por dinheiro. Que hoje morreu um amigo meu no segundo acto. E o terceiro? E as regras da Academia?

Continua toda a gente a perguntar "porquê". Perguntam muitas vezes. Acham surreal a história da Ana bater à porta e estar fechada e trancada, mas que pela frecha conseguiu ver um homem a dançar no ar. Não se sabe há quantas horas ele esteve lá, só se sabe que ele ontem estava bem.

Eu continuo a achar que a razão dos seus problemas continua em papel. Não num papel que ele deixou escrito, mas no horário de trabalho, onde ele está indicado para 83 horas semanais.

Escolheu um bom dia para se matar, um Sábado, um dia de grande lucro para a companhia. Conseguiu descansar, ter folga, ainda por mais num Sábado, num fim-de-semana - quem dera a muitos. Conseguiu libertar-se para sempre da matéria que o prendia - abdicou da sua família e dinheiro: o papel.

Infelizmente continuam todos a perguntar "porquê" e não vêem o seu acto heróico, mas têm pena dele...

Saí mais cedo do restaurante e olhei para o céu. O céu azul abraçava a lua, ainda de dia. Nunca percebi bem estas coisas das regras, mas cá vou andando.

Friday 13 June 2008

O Dia Proletário

Hoje o rapaz entrou 5 minutos antes, para lhe dar tempo de se trocar. Trocou-se, pôs a camisola com o símbolo da empresa mais ou menos na zona do peito aonde fica o coração, desceu da sala comum dos empregados e começou a trabalhar. Antes de começar a trabalhar, não há nada como verificar a lista de tarefas, pois o dia é longo e ele sabe que se fizer tudo na ordem correcta não o podem acusar de nada. "O seguro morreu de velho", ecoava no seu subconsciente.

A primeira coisa que tinha a fazer era limpar todas as superfícies metalizadas. Isto envolvia limpar os sete frigoríficos, à frente e atrás. Limpar atrás significa ter de puxar os frigoríficos à frente, desencostá-los da parede, mas é um processo que é demorado por não se poder puxar todos ao mesmo tempo, caso contrário fica-se sem espaço para circular, e é cansativo, quer pelo esforço físico, quer pela constante movimentação para limpar em cima, agachar-se para limpar em baixo, etc. Isto sete vezes. O rapaz sabe muito bem que isto pode trazer-lhe problemas nas costas, mas que os problemas só vão aparecer daqui a uns anos, e, se correr tudo bem, ele já não estará a fazer este tipo de trabalhos. O salário mínimo tem de ser no mínimo merecido.

A segunda coisa era limpar as prateleiras - nisto começam a chegar os outros colegas de trabalho, que se vão dirigindo cada um ao seu posto para começar aquilo que não pode ser deixado para amanhã. Limpar as prateleiras, mais uma vez, envolve ter de tirar tudo, arranjar espaço para poder pousar as coisas de forma que não caiam, limpar o pó com um pano, passar o spray e puxar o lustro. É um luxo trabalhar num restaurante em que as prateleiras ainda são de madeira. É um privilégio, pois todos sabemos que a madeira é um bem cada vez mais raro. Depois volta a colocar-se tudo de volta nas prateleiras, na mesma ordem em que estava.

A terceira coisa que tem de se limpar é o chão. Alto lá! Falta alguma coisa... Bem me parecia: já devia ter limpo o chão dos frigoríficos, quando eles tinham sido puxados para a frente. Aquela cabeça, meu Deus! Quando se é jovem tem muito de se aprender! Os jovens de hoje em dia só querem borga, trabalhar é o trabalhas. Só por isso, o rapaz teve de voltar a puxar os frigoríficos para a frente e limpar o chão. Já devia ter limpo as prateleiras dentro dos frigoríficos, mas nem quero falar nisso, porque ele no fundo sabe que vai ter de as fazer mais cedo ou mais tarde.

Nisto, chega o gerente que começa por perguntar a razão da porta ainda estar fechada aos clientes. O jovem tinha-se esquecido da porta! Que estupidez! Há coisas que não é preciso estar na lista, que ele já devia saber! A quantidade de dinheiro que o restaurante perdeu naqueles 7 minutos! A quantidade de famílias inteiras que podiam ter entrado, ou mesmo para reservar uma festa de aniversário ou baptizado para mais logo à noite. Às 12:07 o rapaz percebeu que estava despedido. No entanto, o gerente mandou-o acabar os afazeres da lista, antes de o mandar embora. Pagou-lhe as horas de serviço, porque ele sabe que se ele não pagar o rapaz podia protestar demais; e assim, como a situação estava, o rapaz era culpado. É bom ter sempre razão, comprar a razão com o salário mínimo, e o gerente sabe disso. No final ainda acrescentou que provavelmente será expulso do seu cargo pelo responsável pela zona. O rapaz acabou o seu trabalho, recebeu o seu dinheiro e ia para se ir embora.

Desempregado e com fome, o rapaz resolve-se sentar numa das mesas e comer. Afinal de contas, aquela foi a sua casa nos últimos anos, e a comida de casa sabe sempre melhor. Demorou até ser atendido, porque os clientes têm prioridade. Fizeram-no sentar na mesa do fundo, porque os clientes têm direito aos melhores lugares. Mesmo que o restaurante estivesse vazio, eles podiam chegar a qualquer hora! O rapaz mandou vir uma massa carbonara, que chegou meio queimada, na quantidade normal para o cliente, pois ele já não trabalhava lá. Foi provavelmente a primeira vez em muitos anos que estava a pagar por uma refeição naquele sítio.

Nisto entra uma família que quer mesa para 10, mas o gerente diz-lhes que não há pizzas nas próximas duas horas, porque o forno foi ligado tarde. Ele não ouviu o resto da conversa, porque se distraiu com uma das crianças que lhe perguntou aonde era a casa de banho. Isso lembrou-lhe os tempos em que pizza era uma dádiva e que agora é um emprego... era um emprego. Mas é bem provável que o gerente até tenha dito que a culpa foi de um dos empregados que "se esqueceu" e que as medidas já foram tomadas, despedindo-o. O rapaz trabalhava no bar, mas ele tinha assinado um contracto em que era empregado da empresa, por isso tinha que funcionar como em equipa. Se o cozinheiro não tinha ligado o forno, cabia ao empregado do bar relembrá-lo. A verdade é que o gerente não queria começar a trabalhar já, ainda por cima com menos um empregado, ia ter de começar a fazer o trabalho que lhe compete mais o do outro, que haviam sempre sido feitos pelo barman. O rapaz despedido fartou-se de ouvir a conversa do "contracto que assinou pela empresa; trabalho de equipa", e por isso trabalhava muito. Talvez não muito, porque o gerente quando era empregado do bar trabalhava muito mais, segundo o que ele diz.

Ele acabou a sua massa. Pagou e o gerente perguntou-lhe se ia dar gorjetas. O rapaz envergonhadamente tirou duas moedas do bolso e pousou no pratinho. "Só isto?" e pousou mais duas. O gerente, sem agradecer, pôs as moedas no bolso... Perdão! Pôs as moedas na caixa das gorjetas.

O rapaz saiu. Antes de atravessar a porta, o gerente com um sorriso disse-lhe: "Então, boa sorte! Espero que encontres um sítio melhor para ti. Sempre disse que isto era um sítio muito duro para ti." E deu-lhe um grande abraço. O rapaz aí percebeu: afinal o gerente sempre gostou dele, ele é que nunca tinha percebido.

Saturday 7 June 2008

Cães Rafeiros

- Mãe, porque é que aquele cão está a gemer?

- Ele não geme, é assim que ele ladra.

Espera até ao dia em que até a dor faça parte da tua linguagem. É uma questão de tempo, só tens de continuar a esperar, como tens feito até hoje.

Cães de Raça

- Pituxo, corre! Busca! Lindo menino.

(dá um pontapé no cão que começa a ganir)

- Eu não te disse para não correres atrás das pessoas?

- Vá, busca! Lindo… Anda ao dono.

(puxa-lhe a orelha e ele geme)

- Não percebes o que eu digo? Não te disse mais do que uma vez para ladrares aos outros cães?

- Deita! Isso, lindo! Agora espera aqui que eu já venho.

(o cão levantou-se e foi-se embora)

- Oh, meu Pituxo, porquê, porquê?! Deixa-me pôr-te as mãos em cima que logo vês o que te acontece.

(mas ele nunca mais voltou)

Friday 6 June 2008

Oxford 2 - 0 Balbino

Não há invejas, nem arrependimentos. Só tristeza...

2... só tristeza.

Thursday 5 June 2008

Anúncio 02

Antes de ser crítico, sei apreciar a beleza das produções que são feitas, apesar de ter consciência da mensagem que realmente está por trás das cores, sons e efeitos dos anúncios. Num Mundo capitalista, o Marketing é das áreas que mais tem evoluído, não só mexendo com os desejos e necessidades da população, mas entrando nas cabeças das pessoas subtilmente através de grandes jogos psicológicos.

Há certos anúncios que, pela sua vertente artística, me fascinam e muito me ensinam. Respeito imenso o trabalho desses artistas que defendem causas diferentes das minhas e tento aprender com eles. Aqueles que são realmente bons, incitam em mim sensações que me dão prazer e só por isso ganham a minha empatia. Estou a falar de muitos anúncios, mas em particular o novo anúncio da 02. Este anúncio foi lançado em Abril do corrente ano de 2008 e passa nos grandes ecrãs do cinema em Inglaterra - é capaz de passar na TV também, mas como não vejo, não posso garantir.

Se imaginarem uma sala escura, larga, com um ecrã gigante de alta definição de imagem e cor, juntamente com as colunas de som que ali fizeram magia, poderão sentir o mesmo que eu senti ontem ao ver este anúncio.

in Jornal Partido, 8 de Dezembro de 2034

A Coca-cola volta a subir na escala Económica empresarial distanciando-se mais que nunca da segunda companhia que a segue, o McDonald's.

Ontem, dia 7 de Dezembro de 2034, pelas 17:00, foi assinado nos escritórios da sede Nacional da Coca-cola o contracto de compra da Companhia Nacional de Águas. Por um valor astronómico de 4 trilhiões de Euros, a Coca-cola comprou a única concorrente que fazia obstáculo à sua uni-existência no Mercado de Líquidos.

Depois de em 2009 ter comprado a antiga marca Pepsi e em 2016 ter começado a trabalhar em co-operação com equipas de recolha de sangue e espécimes, a Coca-cola atinge o lugar mais alto de todos os Mercados Económicos desde o início da Civilização Humana. A empresa centenária, pelas palavras do seu supremo dono Miguel Sousa, afirma que "isto, antes de tudo, é mais uma prova de sucesso do Bem contra o Mal, aonde continuamos com a nossa luta incessável por uma Economia melhor, uma Economia Ambientalista".

Miguel Sousa é descendente directo do Pai Natal, o fundador da companhia, que a passos largos guia esta dinastia de empresários a um Marco Histórico que muito dificilmente deixará de estar presente nos livros do Ensino Básico de todas as escolas de todo o Mundo, como está há quase 10 anos. O trineto do Pai Natal recebeu apenas aos 3 anos de idade, a condecoração pelas mãos da Rainha Elizabeth IV, tendo sido o mais novo da História a ser nomeado "Cavaleiro do Exército Britânico". Aos 18 anos, o Papa João Paulo III santificou-o, dando origem a uma das maiores roturas na Igreja desde a Reforma Católica, e dando origem a uma nova religião. Miguel Sousa é hoje em dia, uma figura emblemática, um símbolo Mundial e um líder imbatível com os mais puros valores de Paz e União.

Está em vias de conclusão o projecto que já tem vindo a ser estudado pelos cientistas do Mega-grupo Coca-cola: espera-se que em 1 de Janeiro de 2040, todas casas terão acesso a Coca-cola nas torneiras, extinguindo, assim a água como a conhecemos da circulação nos canos. O preço da água já aumentou de 3 Euros para 5.50 e um dos sub-dirigentes do grupo, Ricardo Andrade, afirma que é "Uma vitória para o Mundo". Pelo mesmo ano, poderão também comprar outras torneiras com outras bebidas (por exemplo Gin, Fanta, Sprite, etc), já que todas pertencem à Coca-cola e haverá canalização para permitir o acesso mais fácil aos produtos fornecidos.

Em protestos das massas activistas nas ruas, uma florista afirma: "Isto é uma vergonha! Querem dar cabo do Planeta! Como é que vou agora regar as plantas?" ao que Ricardo Andrade respondeu que "crime é assassinar plantas cortando-as e comercializando as suas mortes".

Miguel Sousa afirma que "Com a Coca-cola não há necessidade de recorrer à água, melhorando o nosso Planeta Azul. A Coca-cola tem substâncias que melhoram a pele e a circulação sanguínea e que só por isso os nossos consumidores estarão sempre a beneficiar, quer a beber, quer a tomar banho - coisa que nunca aconteceu com a água."
Cientistas afirmam que a Coca-cola repõe os valores de açúcar no sangue e que tem havido um processo geral de melhoramento do produto, ultrapassando em todos os aspectos os benefícios que a água poderá trazer.

Para celebrar este marco de mais crescimento do Império Coca-cola, Miguel Sousa está a organizar uma festa a nível Nacional de comemoração no próximo dia 25 de Dezembro, em que todas as bebidas serão gratuitas das 00:00 até às 00:00 do seguinte dia 26. O Ministério marcou uma reunião para a próxima semana para discussão da mudança do dia 25 de Dezembro para feriado Nacional da Coca-cola.

Wednesday 4 June 2008

Semana Santa

Esta semana é a negação da minha não-existência.

Sou o cego de olhos abertos que vai vendo pelos olhos de outros, falando o que os outros disseram, sentindo o que os outros sentiram. Penso com o coração e sinto pelas canetas das mãos dos outros. Vou à raíz da existência humana na cor da Natureza que se verga à força do vento, à luz da cor, fazendo-me esquecer que também sou filho e que um dia vou ser pai.

Sou o eterno velho branco da minha juventude que há tão pouco começou e está tão perta do fim. Sou velho de conhecimento, de sabedoria, de razão e sensatez. Sou velho por já ter sentido demais, e, por demais ter sentido, todos os dias morro um pouco mais.

Esta semana é a negação da minha não-existência.

Apesar da força do novo conhecimento e das formas mais belas que há no Mundo, sou preso à ignorância que me arrasta de novo para o sombrio da minha insanidade. A insanidade que tenho, não por ser culpado, mas por nunca a ter negado. A insanidade que me dá Paz, que me dá abstência de emoção neste quadro de cores vivas que me queimam os olhos.

As pessoas só se ligam quando estão sãs, quando se sentem seguras em confiar. As pessoas têm de ser sãs para crescerem fisicamente. Não basta ter o conhecimento e viver na loucura e rebeldia de guardar no peito a verdade que nos enlouquece. É preciso passar autógrafos, ser entrevistado e conhecido. Porque as palavras podem ser compradas, os pensamentos podem ser financiados e as ideias muitas vezes são postas no prego.

Tenho de existir esta semana, para poder continuar na minha não-existência. Abdicarei, vender-me-ei, a mim e ao meu saber, para poder continuar a ver apesar de cego. Posso trair-me por uma semana, mas eu sei que nunca estive à venda. Nunca.

Monday 2 June 2008

Sunday 1 June 2008

Quando é que se envelhece?

É através da lei dos contrastes que se tem a percepção da realidade.

Um menino veio ter com o seu avô e perguntou-lhe quando é que ficou velho e porquê. Uma pergunta mais inocente do que simples deste género é capaz de fazer com que um comboio de imagens passe na nossa cabeça, deixando uma poça de água dentro de nós, que incontrolavelmente despejaríamos em lágrimas. Lágrimas essas que seriam choradas, secadas, transformadas em nuvens, chovidas, nascidas de uma fonte, bebidas e tornadas a chorar por outra pergunta de outra criança. São as crianças que nos fazem chorar, as crianças, os loucos e os alterados por outras substâncias que fazem com que as pessoas regressem mentalmente à sua infância. E são sempre os sábios, os velhos, os cientes que choram. Choram por eles próprios, choram pelos outros, choram. E hão-de chorar sempre, porque a água tem de ser filtrada neste ciclo. Lá chorava o velho.

O menino não percebia o que se passava e afastou-se com um estranho sentimento de culpa com gotas de arrependimento e uma palhinha de sabor a incompreensão. Bebeu aquilo tudo de uma vez e afastou-se, num choque geraria um trauma – ver o avô chorar.

O velho, em solidão, recordou-se daquela noite em que se deitou na cama sozinho, já que a sua mulher estava na cozinha a fazer outras coisas. O velho deitou-se na cama e quis masturbar-se, para relaxar, tal como fazia nas noites em que vinha muito cansado da sua vida de jovem, trazendo-o um misto de Paz e Prazer numas gotas que mais tarde viriam a ser os seus filhos. Começou por lembrar-se da sua mulher, mas não conseguiu atingir a erecção. Talvez por ter dormido demasiados anos ao lado dela, ou talvez por ela não ser mais a mulher que foi um dia. Partiu, assim, com a sua memória para outra mulher que tinha conhecido quando era jovem. Mas nada.

Partiu para outra, e outra e mais uma, mas nada. Até que chegou a uma das suas grandes paixões da sua vida, outra mulher fabulosa. Mas ele tinha-a visto há dois anos, e estava velha. É quase sempre a última imagem que fica, nestas alturas, e como tal associou o seu corpo desnudo de 17 anos que várias vezes viu, àquilo que deve ser qualquer coisa parecida com o actual corpo da mulher. A erecção continuou como sempre estava: sem ter começado. Em pânico, fez uma passagem por todas as mulheres com quem teve relações, quer tenham sido dois encontros, beijos ou apenas uma carta com promessas que nunca se chegaram a cumprir. Nem assim. Naquela idade, já não resta muitas hipóteses, e fez a lista mental de todas as mulheres que conhecia, todas, até as menos atraentes, pensou numa a uma.

Este processo demorou horas e aquilo que começou por ser uma empresa com o objectivo de Paz e Prazer tornou-se uma guerra sanguinária entre o que precisava e as condições a que estava reduzido. Nisto, deu tempo para a mulher vir da cozinha, lhe dar o beijo de boa noite, ler o seu livrinho, dar outro beijinho de boa noite e finalmente adormecer – tal como fazia todos os dias há mais de 20 anos. O velho começou a chorar por não conseguir sequer masturbar-se. O velho chorava a altas horas da noite, na sua cama, com a mulher ao lado que dormia. Chorava de tal maneira que acabou por acordá-la. A mulher quis saber o que se passava, que não compreendia e que ele não lhe queria explicar, com o olhar fixado para o tecto, escorrendo lágrimas dos cantos dos olhos para os ouvidos.

Quando o menino fez aquela pergunta, todas estas memórias lhe passaram como um trovão em frente dos olhos, não assustando-o, mas aterrorizando-o por ele ter encontrado resposta à pergunta do menino mesmo sem ter de pensar/procurar nela. Foi naquela noite, na cama, que descobriu que era velho. Foi quando descobriu que era fisicamente incapaz de amar, incapaz de se amar a si próprio, como antes fazia… oh, e quantas vezes ele o fez!

Mas como explicar a um menino a importância da masturbação, do sexo, do amor carnal? Como fazer entender isso ao menino, se ainda não lhe foi dado aquilo que um dia lhe viriam a tirar, deixando-o na desgraça, como o seu avô ali estava: o apetite sexual.

O avô chorava. Por saber demais. E por não poder fazer nada.

- Francisco, volta ao avô, não ligues ao avô a chorar. Não tenhas medo. Tu também choras, não é?

- Sim, quando estou triste.

- O avô já parou de chorar, vês?

- Sim. Porque é que choravas?

- De alegria.

- De alegria? Eu quando estou contente, riu-me, não choro.

- De alegria, por um dia ter tido a tua idade e nunca ter imaginado que viria a ter um neto como tu. Amo-te muito.

- Eu também, avô.


Paz e Amor/Prazer é para todas as idades, porque "Na natureza, nada se ganha, nada se perde, tudo se transforma" - Lavoisier. O velho percebeu, ali, que a pergunta não era "Quando é que se envelhece?", mas "Quando é que se deixa de Amar?".


Nunca. Diz sempre nunca!
"Ser é pensar e agir." - Leonardo Cascaes