Deitei-me em cima dela e comecei a remar para fora. A espuma das ondas varria o inside e dificultava que eu fosse lá para fora. A primeira onda que rebentou lá ao fundo e veio arrastando-se aproximava-se. Fiz o primeiro bico de pato. Fui arrastado um pouco para trás, mas segui em frente, remando. Mais vale fazer o bico de pato e andar um pouco para trás, do que nem sequer fazê-lo. No surf, não temos muitas alternativas. Depois de várias ondas, com os ombros doridos de tanto remar, com a respiração ofegante, mas sempre em cima da prancha, consegui finalmente chegar ao outside calmo.
E tão calmo que é o outside.
O outside é o santuário de todos aqueles que aguardam que os messias venham para os purificarem. As ondas vêm como vagas de ressurreição antes da morte, como máquinas do tempo que poucos podem experimentar. Ao vir a onda, começo a remar. Remo, remo, remo e apanho... sinto que a prancha continua a deslocar-se na água, mesmo comigo tendo parado de remar. É nesta altura que me levanto e corto a onda, numa velocidade instável mas suave.
E é assim, também o levantamento do alter às 7:00, com as corridas de bicicleta matinais, os treinos de artes marciais às tardes e finalmente as duas refeições por dia, que o meu corpo volta a mudar. Fica mais forte. Mais seguro, mais saudável, mais atraente ou - deverei dizer? - menos repulsante. Tenho plena consciência que este corpo não me pertence, simplesmente pela sua efemeridade. E nem fico mais sábio por este "aculturamento" físico, muito pelo contrário - poderão dizer - que fico mais perto dos cegos que ficam hipnotizados pelos espelhos que cantam as cantigas da moda.
Eu sou fraco porque tenho um corpo.
Cuidar do meu corpo dá-me uma paz qualquer. Uma paz que, sei muito bem, não é minha. É nestas pequenas coisas que eu descubro que não gosto de mim, e cada vez menos dos outros. Mas fazer desporto e ser fisicamente é activo é uma grande paixão que só igualada a uns bons pastéis de nata, um valente cozido e uns maravilhosos batidos que engordam. Se o meu corpo fosse meu filho, eu seria um pai irresponsável. Mas os meus filhos amar-me-iam.
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2 comments:
Pedindo antecipadas desculpas pela “invasão” e alguma usurpação de espaço, gostaríamos de deixar o convite para uma visita a este Espaço que irá agitar as águas da Passividade Portuguesa...
Jovem...
Desaparecido do blog?
A malta sente a tua falta....aparece
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