Reparei nas flores dos campos em que ia passando. Sentei-me ao lado de uma delas. Achei-a bonita, e não quis arrancar. Eu sabia que este sentimento é hipocritamente efémero, caso contrário, teria me sentado mais vezes ao lado dessa flor; afinal de contas estou na rua de casa. Aprendi aos poucos a respeitar tudo aquilo que não se pode defender.
Levantei-me e segui. Passei pelos edificios da escola, passei pelo meu edifício, onde tenho as aulas. Tudo escuro, luzes apagadas, portas fechadas, sem pessoas, sem ninguém. E daqui a umas horas vai estar impossível entrar sem dizer "excuse me". É bom olhar para algo e ver o outro lado... Porque os edifícios também têm de descansar. Posso ter ficado a olhar para a entrada do St. Andrews Building uns dois minutos, mas passou-me tanto dos olhos cá para dentro. Foi uma fotografia que tirei com os olhos. É estranho olhar para uma fotografia de um sítio em que nunca estivémos, acabamos por ficar a olhar para a foto e não ver nada, senão uma paisagem. Ou então, começas a imaginar andar por aqueles campos, encostares-te àquelas árvores e imaginas o que está à volta da imagem. Tal como se a fotografia fosse uma coisa 360º, como aquele que tirou fotografias da praia onde estava sob o seu eixo, dando uma volta completa. Depois esse indivíduo, colaria as fotos nas paredes da cela aonde estava preso, para quebrar o gelo das paredes brancas. Eu pensei nisso tudo naqueles dois minutos.
É olhar para o sítio que vou deixar daqui a uns seis meses e provavelmente nunca mais voltar. É assim que se devem olhar as coisas.
Continuei a andar, em direcção à ponte. A caminho vejo que o nível das águas subiu e que os cisnes estão todos no passeio, mesmo à borda da água agora castanha, mas ainda há dias límpidas. É inevitável vir para sítios destes e não se lembrar da Dama do Lago. Ainda mais para quando se vive sozinho e não se tem amigos, afastado de tudo e de todos. Apenas próximo daquilo que será daqui a uns anos imagens na minha cabeça cansada e uma linha no meu curriculum.
São riscos que gosto de tomar, mas que muitas vezes me arrependo. Mas como não há volta atrás, sou empurrado para a frente. Enfim...
Mas é com um sorriso na cara que vou andando por estas ruas que sinto que não são minhas, mas que, no entanto, estão completamente entregues a mim, vazias. Sento-me num banco solitário. Sento-me por dez minutos, porque o frio é demasiado para se aguentar com apenas estas roupas. O cisne vem ter comigo. Falo com ele, mas ele não parece perceber-me. Mas ele parece sentir-me. E vem ter comigo. É nestas alturas, quando não há fisicamente mais ninguém, quando um homem pensa que trás o peso e a tradição de uma nação, quando aos 16 anos abdica do Mundo por uma vida na arte que percebemos que há coisas mais importantes que
Espíritos de pessoas que se sentam ao meu lado para me aquecer e meter conversa. E, quando dou por mim, volto ao banco aonde estou sentado, volto desta trip, volto a sentir o frio e vejo à minha volta... silêncio... luzes... o rio... a ponte... vejo prédios... e os cisnes no rio, misturados com a minoria dos patos bravos e outros pássaros. E o cisne que veio ter comigo para me dizer boa noite, voltou para ao pé dos outros.
Eu não vim trazer a minha solidão às ruas, simplesmente vim juntar-lhes a minha para lhes fazer companhia.
1 comment:
Uma lágrima. Duas. Três. Quatro. Pronto... Chega.
Um nó na garganda, deve ser do frio. Porque aqui também está frio, mas não existem cisnes por perto, existem mascaras brancas a moveem-se de um lado para o outro.
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