As cócegas podem fazer rir, mas também podem irritar muita gente.

"Seja bem-vindo quem vier por bem!" e "se à porta humildemente bate alguém, senta-se à mesa com a gente!"

Recomendação Sonora

Wednesday, 13 February 2008

Pequeno Pedro

Pequeno Pedro que levantas os olhos para as nuvens e sonhas com o inatingível.

Pequeno Pedro, és tão pequeno.
Pedro que nasceste do Mundo para o alimentares, Pedro que jamais te libertarás por teres um passado, mesmo que a ti ele não te pertença. Serás o eterno beijo de boa noite nos lábios da Mãe Lua e a eterna penitência do Pai Sol.

Ergueste-te um dia da tua solidão para conquistar o Mundo. Respiraste ares que não vêm no vento, andaste caminhos que ninguém devia pisar, procuraste as coisas que ninguém mais procura.

Trocaste o teu passado pelo teu destino.

Só, confiante e supremo encontraste uma sombra negra que te deu o Conhecimento e Razão. Purificaste-te segundo o proíbido e rejuvenesceste um sonho. Rejuvenesceste o teu sonho e o de toda a gente.

Estás agora rodeado de pessoas. Muitas pessoas, todas as pessoas. E muito distantes de ti, tu estás em evidência. Estás na Luz. As massas mexem-se em fazem barulho às tuas batidas cardíacas. Todos te veneram e vêem em ti o Messias salvador. Riem-se e festejam de alegria. Tu, modesto e sensível, sorris. Sorris de uma humilde felicidade de quem não pede mais nada que um reconhecimento por um ser individual e livre. E quando te sorris, mais festeja e mais feliz fica a multidão. Multidão que se mexe de forma frenética caótica. Multidão que nunca te pertenceu e que te faz emocionar por pensares que agora faz parte de ti.

Um silêncio pálido assombra as vozes do povo. Tu não percebes e continuas a sorrir. Mas não por muito tempo. Páras para perceber o que se passa à tua volta. Aonde terá ido a tua glória que a tantos inspirava, que fizeste tu para os fazer calar.

Abrem-se os portões. Soltam-se as bestas. Animais selvagens e violentos carregados de ódio que se atiram às paredes da arena aonde estão, aonde estás. O povo continua calado. As bestas que se devoram, mordendo e despedaçando membros do corpo umas às outras. Bestas que se sujam de sangue e de raiva feliz. As bestas que, personificações do ódio, reparam que não estão a sós. Miram a platéia deste enorme Coliseu em silêncio. Tentam perceber se há vida, investindo contra as tábuas da parede, mas ninguém se mexe, ninguém respira. Frustradas, as bestas param com aquele espectáculo ridículo, virando o seu ódio para outras paisagens. Virando os seus azimutes para ti. Mirando-te de alto a baixo, na tua modéstia, as bestas ficam estupefactas e piedosas. Neste momento a multidão volta a respirar, num caos maior que o anterior com os seus cânticos de vitória, glória, festa e divertimento. As bestas começam a caminhar na tua direcção. Já não há nada que as faça parar. O público e os gritos das pessoas são mudos e influentes - nem motivam, nem desconcentram os bichos - aos ouvidos das bestas que, saltando umas por cima das outras num tornado de ódio caminham na tua direcção. Com passos confiantes, curtos, curtos, curtos, menos curtos, menos curtos, menos curtos, menos curtos, menos curtos, menos curtos, menos curtos, largos, largos, largos, largos, largos, largos, largos, largos, a correr, correr, a correr, a correr, a correr, a correr, a correr, a correr, correr cada vez mais rápido, mais rápido, mais rápido, mais rápido, mais rápido, mais rápido, mais rápido para ti, para ti, para ti, para ti, para ti, para ti, PARA TI, PARA TI, PARA TI PARA TI, PARA TI, PARA TIIIIIII!

Pequeno Pedro, és tão pequeno.

4 comments:

calminha said...

fiquei a ler e a deixar-me absorver pela beleza das palavras...sentiste-as...um abraço

Anonymous said...

Granda Balbas! Gostei bastante. A parte final denota alguma influência do futurismo e/ou do modernismo, reminiscente de um manifesto anti-dantas. Continua.

O Pentagrama said...

Definitivamente bom. Difícil de entender. Não creio tê-lo entendido na sua totalidade.

Gostei.


---Jolly Roger

Teresa Raquel said...

O texto chegou quando eu mais precisava....são estas as coicidencias que me fazem acreditar. Tão bom gostar de ti, gostar do que escreves, não há como não gostar.