Estou cada vez mais crescido.
São as pequenas coisas do dia que me fazem perceber que estou feito um homem. Sou realmente um adulto. Um homem que beija mulheres e vai para a cama com elas. Um homem que fuma, que bebe, que conduz e usa dinheiro.
Ainda há pouco tempo me cresceram os primeiros pêlos no corpo, de baixo dos braços, na zona púbica e alguns na cara. Passado algum tempo, os pés começaram a mudar de número todos os anos, o mesmo com a roupa, com as calças e T-shirts. Os pêlos continuaram a surgir por todo o corpo, à volta do umbigo, alguns no centro do peito. Esses peitos agora, lastraram-se um pouco por todo o corpo, expandiram-se em todas as direcções, como um verdadeiro homem. O mesmo com os pêlos incolores das mãos e braços que escureceram.
Fora do meu corpo, há gente na minha família a morrer, como o meu bisavô por causa do qual me chamo Carlos Eugênio Freire. Tudo parece crescer, alguns até ao seu limite - morte. Isso faz de mim um homem. Um verdadeiro homem que aguenta as mudanças do tempo, que aguenta tudo por ser um homem. Eu sou um homem. Sou um homem forte.
E neste corpo que mal conheço por me ser tão recente, começo a redescobrir - por baixo de todos os pêlos de homem - uma pessoa que ainda há pouco tempo fui, mas que da qual já não me recordo. Para que serve este pêlo todo, esta barba, estas mulheres, estes vícios, esta liberdade se agora tenho menos do que antes tinha. Sinto-me, cada vez mais, prisioneiro do tempo, escravo de mim mesmo consequentemente.
Para que serve esta força toda, se eu ainda choro. E se, quando choro, ninguém me acude precisamente por pensarem que eu já sou um homem? De que me servem as mulheres e os seus lábios e peitos, se tudo o que quero é uma mulher, e uma só que possa substituir a minha mãe, que use os lábios da forma que ela usava, e me dar peito quando choro, tal como agora choro? Para quê o dinheiro, se isso não consegue parar as lágrimas que pingam salgadas nos meus lábios dando-me este sabor a comida feita por mim... mal temperada... porque já ninguém cozinha para mim, porque agora sou um homem. Nem preciso de mais camas do que a da mulher irá substituir a minha mãe.
Mataram a criança em mim! Alimentaram com desejos de crescer e, agora, tiram-me todas as liberdades, tiram-me tudo, incluindo a hipótese de voltar a ser criança, de brincar com carrinhos e imaginar que conduzir é bem melhor do que aquilo que sei hoje. Imaginar tudo em grande, querer ser tudo e poder ser tudo em grande, em brincadeiras, nas paredes do meu quarto, sozinho com os meus brinquedos, meus fiéis amigos que estão lá sempre no mesmo sítio aonde os deixei no dia anterior. E a minha mãe... aonde está a minha mãe? Aonde está ela agora que preciso...? Quem me acalma, agora? Quem me assoa o nariz entupido? Quem me diz que está tudo bem?
Ninguém...
... porque estou condenado a ser homem.
Subscribe to:
Post Comments (Atom)
1 comment:
Se há boa escrita é definitivamente o que tu fazes. Escreves os sentimentos do humano comum como nunca vi ningué, fazê-lo. Continua o bom trabalho, Balbino.
Post a Comment