As cócegas podem fazer rir, mas também podem irritar muita gente.

"Seja bem-vindo quem vier por bem!" e "se à porta humildemente bate alguém, senta-se à mesa com a gente!"

Recomendação Sonora

Wednesday 17 December 2008

Natal em Dedben - Parte Um

Hoje resolvi sair da cama pela primeira vez numa semana. Tenho andado com uma tosse estúpida que nem me deixa dormir, nem me dá vontade para nada. Mas por causa disso, comecei-me a dedicar em força a uma práctica que já tinha feito, mas que nunca dediquei o quanto preciso - a leitura. Li um livro, comecei a ler outro mas - que por ser uma seca enorme em que o autor já foi resumido nos longos prefácios - abandonei no primeiro capítulo, e hoje vou acabar de ler outro. Também tenho visto alguns filmes e ouvido alguma música que me é nova. De certa forma, tenho estado a renovar os meus conhecimentos com coisas novas. Mas hoje tinha mesmo que sair da cama.

Lá fui para Loughton (cidade vizinha que fica a vinte minutos a pé) em direcção ao banco, para depositar a renda na conta da senhoria. Fui à livraria, pois tenho um trabalho de casa em que consiste ler um dos livros da lista na perspectiva de uma personagem. Ou seja, antes de o começar a ler, vou ter de entrevistar uma pessoa no seu emprego para mais tarde, sem ela saber, recriá-la num estúdio com os meus orientadores e turma. Como sei muito bem quem vou entrevistar - o paquistanês que trabalha no Favourite Chicken (do género KFC) - posso ir adiantando a compra do livro, que calha bem com o final da leitura deste que estou a terminar.

E qual é o livro que eu vou comprar, da lista? Ora bem, na lista temos o Blindness by José Saramago (Ensaio da Cegueira) e o blá-blá-blá-blá. Está visto qual foi o que escolhi: o segundo blá. Não, nada disso, foi mesmo o livro português, que me calha muito bem, porque ainda me lembro quando andava na Escola Profissional de Teatro de Cascais, onde o meu último teste, do meu último módulo de Português tinha sido precisamente sobre a obra O Memorial do Convento, do mesmo autor, e aonde tinha alcançado a nota mais alta da turma - dezoito - e que me fez ficar muito irritado com a professora por não me ter dado o vinte. Era uma aposta pessoal que lhe tinha exposto, que alcançaria o vinte no último módulo do terceiro ano, já que andava a tirar dezoitos desde o primeiro período do segundo ano. Mas como ela teve um aluno excelente que a impressinou de tal maneira a ela dar-lhe o primeiro vinte da sua vida - e único - enquanto professora. Eu sempre fui rebelde, desafiador e perturbador. Nisto os meus conhecimentos de Almeida Garrett e estética literária não serviam mais para a impressionar e murmurar com um descontentamento na entrega de cada teste "Ai, se o Carlos se portasse melhor...". Aqui está uma moral de vida: nas escolas, ter conhecimento não basta, é preciso saber-se comportar - e eu sei o que escolhi. Desta vez, para o teste, inverter a minha maneira maquiavélica para frases longas, de um humor crítico mas sonso - witty, como os ingleses lhe chamam (e muito gostam eles de usar esta palavra) - em que os pontos e vírgulas eram as únicas pontuações, tal como o Saramago o fez, não foi sufiente para o meu vinte. Aliás, foi mais que suficiente - ela é que não assumiu.

É engraçado, como o parágrafo mais longo desde texto é uma frustração minha. Mas muito sinceramente acredito que os livros estão todos feitos de frustrações dos autores - o importante, enquanto escritor, é não se deixar dominar com elas, mas brincar, usá-las, para que elas se frustrem de nós. E isto era mais uma nota para mim.

O senhor da livraria não o tinha em stock e teve de encomendar. £7.99 tive eu de pagar, por um livro português numa versão inglesa (eis um excelente exemplo de outra frustração, mas como pode ver-se é muito mais subtil. Este é o tipo de frustrações que lemos nos livros. Não é mau, é witty). Ficámos assim: na próxima Quinta-feira a partir da hora de almoço, já posso ir lá buscar o Blindness, o que até me dá um espaço de um dia para entrevistar o meu amigo Shakir, no Favourite Chicken.

Subo a rua principal de lojas de um lado e do outro e, chegando ao topo, começo a descê-la, ainda e sempre de lojas de um lado e do outro. A caminho do supermercado Morrisons - o nome de um dos meus ídolos agora a ser usado como centro comercial - encontro dois bacanos do curso mestrado em Teatro (Interpretação) Internacional, a Tanya do Canadá e o Razz da Tailândia. Na conversa descubro que o Razz mora na rua perpendicular à minha e já me está a convidar para uma sessão de chill out na sua casa. Começo a dizer que ando com ideias de fugir da Escola e eles dizem que vão fugir para a Rússia, para o ano. Que o curso de mestrado dura dois anos - apesar de a maioria o fazer em um - e que os que ficam para o segundo ano vão para a Rússia. Lá estão os meus olhos outra vez a brilhar a pensar na Polónia e as pesquisas de Grotowski (o meu seguinte passo secreto). Para me porem mais miserável ainda me dizem que os que estão tirar mestrado em encenação vão para Bali... Cheque-mate!

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